Veja esse tempo amorfo,
Essa fumaça suspensa.
Sinta o ardor dos meus olhos
Por causa da noite insone.
Olhe essa vermelhidão,
Sem uns óculos sequer
Para disfarçá-la.
As árvores foram queimadas.
Parece que todo calor desesperado
Está em mim.
Parece que todo estalido
Das chamas que avançam...
Parece que esse barulho...
Parece ser incessante
O silêncio do desespero
E o encontro da alarde
Fuga para a morte agonizante.
Eu sou o cerrado.
Torto, retorcido.
Manancial poluído.
As minhas madres não
Produzem mais a vida
Desde o tempo em que
Não mais recebi as
Bênçãos das chuvas.
Agora sou bairros Norte, Sul, Sudoeste, Noroeste e Condomínios.
Sou a expansão desordenada para os lados e para cima.
Em todas as direções, casas, apartamentos e avenidas engarrafadas.
Sou erosão e solo infértil.
Tornei-me uma estufa de especulação imobiliária.
Agora sou pasto vasto, uma plantação de milho e soja sem fim.
Meu solo é embebecido de agrotóxico e os meus filhos
Morrem de câncer.
Não é Deus que quer assim; é a ganância que não tem a medida da maldade.
Desesperem-se. Manerem. Em breve, muito em breve, não se ouvirá o canto
Da cigarra.
Daniel de Castro
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