27 de set. de 2011

Abutres

Além do objeto, além de todo movimento mecânico,

Transpus na sobriedade de uma dor existencial.

Fui quase natimorto nascido a fórceps.

Ainda rapaz, amaldiçoei o dia em que sai das

Entranhas de minha madre.

Os amores primeiros sofreram graves rupturas.

Trilhei por caminhos que me levaram a ver e sentir

O cheiro das carnificinas.

Vi abutres ao lado de amantes.

Vi abutres só aguardando um pouco mais

De abatimento de tão frágeis almas.

Vi abutres terminando por se deliciarem ao sabor de

Sangue debilmente circulante em espectros

Que acusavam os últimos esforços pulmonares.

Não me atrevi pelos mares. Não os naveguei.

Perdi-me em olhares lânguidos. Em beijos não sóbrios,

Evadi-me da terra por uns instantes supervalorizados.

Dulcíssimas costas, finas cinturas, pescoços adoráveis.

Vozes sonolentas em meio a promessas e sorrisos abafados.

Naveguei profundamente. Amei amargamente.

Não casei. A noiva não teve o anel trocado. Ela se desfez em lágrimas.

Não tive filhos, mas pari histórias funestas para as

Quais fui o próprio parteiro.

Por tudo isso, não morri, mas não estou mais além do objeto.

E tampouco desconheço os movimentos mecânicos

Dos seres solitários:

Sorriso artificial e felicidade aparente.

Daniel de Castro

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